sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Vida Passageira

Música para ouvir durante a leitura.

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São dias como esse que me faz ter a certeza de que não vai adiantar nada. De que não existe caminho certo ou errado. Do lado de lá, existem as mesmas pessoas que do lado de cá. É só uma questão de escolha: qual lado você quer ficar?
Ontem eu caminhei pelo centro da cidade e vi um homem, abrindo mão de sua privacidade para poder fazer suas necessidades fisiológicas. Em plena praça pública. Um homem de meia idade, corpo pesado, barba e cabelos sujos.
Aquele homem podia ser meu pai. Podia ser o seu. Mas não. Ele é o pai de qualquer um. Ou talvez nem pai ele seja. Mas era um homem, digno de merecer um lugar para suas necessidades.
Tem muitos homens como esse aqui do lado de cá. Muitos catadores de lixo, muitos moradores de rua, muitos vagabundos, muitos bandidos, mas todos homens. Todos merecedores de uma vida digna. Mas eles sorriem. Acredite, eles sorriem. No final do dia, enquanto o sol se põe, eles se acomodam em um canto qualquer da cidade com seus papelões, e ai é possível ver esses homens sorrindo um sorriso sem dente, mas sincero.
O outro lado tem mansões, televisão de plasma, mesa farta, pessoas “civilizadas”. Tem banheiro. E você fecha a porta quando quer fazer alguma coisa, porque não tem coragem de fazer na frente dos seus pais. E isso não te torna um ser humano babaca. Mas isso também não te torna um ser humano melhor do que ninguém.
Se as pessoas soubessem sonhar mais. Amar mais. Fazer mais elogios. Talvez o mundo fosse outro. “Estamos condenados a vida” é a célebre frase dita por um catador de lixo. Não acredita, não é? Mas é.
Às vezes, a sensação que eu tenho, é de ter perdido uma pessoa. Um grande amor, talvez. Talvez não. É um grande amor. Mas sempre que penso nisso, logo em seguida tento pensar que o mundo ganhou uma pessoa. Uma grande pessoa.
Deixa de doer? Não. Claro que não. Dói muito. Mas isso me torna mais humano. Isso faz eu ter vontade de arrancar alguns dentes da minha boca, só para poder dar aquele mesmo sorriso sincero daqueles homens com papelões.

3 comentários:

  1. Chico,

    você é uma contradição! Escreva, escreva e escreva. Quero continuar a ler.

    Jú Ostini

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  2. A música completa toda ideia do texto... Muito bom! Beijos

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